O fenómeno da proliferação religiosa – Marlene Messele
O fenómeno da proliferação religiosa - Marlene Messele
Marlene Messele

Entende-se por religião um conjunto de princípios, crenças e práticas de doutrinas baseadas em livros sagrados, que unem seus seguidores numa mesma comunidade moral, chamada Igreja e que praticam a solidariedade (Guidens, 2014).

Entretanto, a solidariedade não pode ser entendida como a acção de doar todo o salário, casa, carro, empresa, joias, terrenos, uma parte de todos os presentes que se recebe, herança e etc.. por achar que só assim será abençoado e apenas assim será possível expulsar os demónios. O facto de se obter algum bem já devia ser considerado uma bênção de Deus!

A proliferação de seitas religiosas é um facto constatável no nosso país. A sua complexidade e abrangência exigem uma abordagem interdisciplinar, razão pela qual diversos especialistas em Ciências Sociais têm discutido o assunto nos meios de comunicação social, com o propósito de prestar algum contributo no esclarecimento deste fenómeno.

A chegada do Cristianismo, em cumprimento do mandato divino “ide por todo mundo e pregai o Evangelho a toda criatura”, resultou na coexistência com a religião tradicional. A aceitação do Cristianismo não significou a rejeição da religião tradicional africana. Pelo contrário, ocorreu um fenómeno conhecido como sincretismo religioso, isto é, a fusão entre a religião tradicional e o Cristianismo que deu origem a vários movimentos religiosos.

Os factores que contribuem para a proliferação das seitas religiosas são:

  • Desvios de interpretação dos textos sagrados decorrentes da deficiente formação bíblica, teológica e secular de muitos líderes religiosos;
  • Não investimento de muitas confissões religiosas no sector da Educação;
  • Interpretação deturpada da Teologia;
  • Carência monetária e afectiva;
  • Criação de normas para favorecimento próprio;
  • Disputa pela liderança.

Entre as causas que levam indivíduos à adesão das seitas apontamos quatro:

  • Frustrações;
  • Fanatismo religioso;
  • Baixo nível de escolaridade ou desemprego;
  • Problemas sentimentais, familiares, de saúde, a necessidade de almejar salários altos ou o ápice pelo imediatismo.

Para um país como Angola, influenciado pelo Cristianismo, sugere-se que as igrejas cristãs desenvolvam contínua e profundamente um trabalho de evangelização e promoção do ensino, elemento que, à semelhança da Palavra de Deus, liberta o homem da ignorância e do obscurantismo, uma forma de elucidar os vulneráveis sobre diferentes formas de resolver problemas diários e acautelarem-se das seitas.

A Igreja é uma instituição social e, ou seja, um agente de socialização que transmite valores de uma geração para a outra. Por isso, além de ser bem constituída, deve ter uma hierarquia séria.

Já a seita é um agrupamento de pessoas que professam a mesma doutrina, uma pequena organização que, por regra, surge de rupturas. Quase todos os líderes são leigos, os pregadores sem formação específica mas que declaram ter recebido chamado para pregar o evangelho.

Actualmente, as seitas são incontáveis na sociedade, pois actuam de forma assustadora. Em Angola, têm influenciado, negativamente, a cultura angolana, tendo em conta que alguns mágicos, actores de pregações da internet aproveitam-se da fragilidade de algumas famílias para enriquecimento ilícito e tornarem-se famosos. Tais acções têm contribuído para a desestruturação de famílias.

Com o andar da carruagem, esses charlatões gospéis, influenciadores digitais de pregações jograis, levam-nos a crer nas teorias de autores que construíram suas enunciações sobre este fenómeno. Segundo Durkheim, “se a religião é feita de ritos visíveis e Deus não é um facto social, por não ser visível, então Deus é a sociedade”.

Max Weber, por sua vez, afirma que “a religião é um coração num mundo sem coração, em função de algumas práticas que levam indivíduos à infelicidade, onde preferem sofrer dando todo o dinheiro e bens à igreja, por terem esperança de viver felizes num mundo imaginário”. Já para Karl Marx, seita é uma organização dominante para extorquir os menos assimilados.

Uma outra visão e mais sólida é apresentada por Augusto Comte (1839), ao afirmar que “a religião é espiritual e não material”.

Portanto, é fundamental que as autoridades competentes tomem a peito a questão das seitas religiosas. É, por isso, necessária uma maior fiscalização no reconhecimento das igrejas, que deve ser antecedido de um controlo sobre os seus ritos.

A juventude actual quer um futuro melhor, viver bem, dar-se bem na vida política, nos negócios, na carreira profissional, ter um diploma, bons amigos, ser famoso, vestir bem, ter muito dinheiro, casar e dar festa de sonhos mesmo sem sonhar, ter carro, casa própria, sair do status medíocre ou médio para o status ascendente e ser tratado em função deste estatuto.

Cada um, de forma particular, tem sonhos, anseios ou ambições. Isso é legítimo, mas há uma pergunta que não se cala: será que os seus actos permitem almejar dignamente o sucesso duradouro?

Observando as acções de alguns jovens da actualidade, nota-se que grande parte destes encontra-se, cada vez mais, engajada com situações relacionadas à representatividade, violência, preconceito, exclusão e inclusão de grupo de pares, sexualidade, drogas e bebidas alcoólicas; exposição na internet; difamação de pessoas, partilha de conteúdos fúteis; mudança do corpo por intermédio de cirurgias de risco, gestão financeira irresponsável, bullying no grupo de pares, envolvência com religiões com práticas duvidosas para realizar desejos, entre outros.

Um número considerável dos jovens de hoje deseja entrar na vida política e trabalhar sem ética, ser chefe organizacional sem esforço, viver de ostentação, baixa aceitação pessoal, luxúria. Muitos deles, mesmo sendo adultos, exigem dos pais condições para satisfazer os seus anseios, como se de crianças se tratassem. Situações difíceis que criam dificuldades na projecção futura porque desvirtuam o foco.

Actualmente, os jovens são atraídos pelo entretenimento, games, educação informal, compras, desportos, tecnologia sem limites, viagens, relações sem responsabilidade, escândalos cibernéticos, amizades ou relações problemáticas. Têm como desejo ser influentes digitais ou referências na música. Muitos não conseguem gerir suas emoções e desejo e enfrentam problemas tais como baixa auto-estima, isolamento social, vício em tecnologia para passar o tempo, estresse e depressão”.

Devem ser adoptados pequenos gestos para mudar este tipo de atitudes: não desperdiçar o tempo, ser consumidor consciente da internet e telemóvel, pois quando mal gerido desorienta a vida quotidiana.

Os jovens devem optar por um estilo de vida mais saudável, cuidar do meio ambiente, praticar a empatia para melhorar a convivência, doar-se por acções sociais, respeitar os mais velhos, ser pacientes e primar pelo controlo das finanças, pela formação técnica e profissional, deixar de partilhar conteúdos fúteis e optar pelos educativos.

Devem, igualmente, promover conversas científicas, assistir colóquios e dedicar-se à leitura, até porque quem lê um livro é um ser transformado. São de facto essas práticas que os jovens precisam. Jovens imersos na tecnologia digital, com novos hábitos em relação às gerações anteriores, deviam na verdade usar a tecnologia para desenvolver o meio onde interagem.

Os jovens sempre desempenharam papel fundamental nos movimentos sociais, organizam e participam em manifestações, ocupam o espaço público com demandas sociais, políticas, económicas e culturais, embora vezes há que é notório a falta de ética nesses agrupamentos.

A importância da juventude reside exactamente no facto de ser uma etapa de transição e amadurecimento pessoal.

O autoconhecimento deve estar entre os temas que os jovens precisam ouvir, pois o desenvolvimento da auto-estima, autoconfiança e inclusive a busca por realizações ou sonhos só acontece quando a pessoa se conhece e sabe onde quer chegar.

Os jovens devem ser agentes de transformação com potencial para impactar, não só o amanhã, mas o hoje. “Ser jovem é saber o que se quer ter sonhos e metas para alcançar objectivos, é saber lidar com as adversidades encontradas na trajectória da vida, é saber resistir aos perigos que a vida impõe.

Analisando minuciosamente o panorama das suas acções, actualmente parece que muitos deles estão avariados no tempo, tornando-se imediatistas. Escolhem mal as referências para inspirarem-se e essa escolha sem maturação leva parte deles à perdição, tornando-os em seres acomodados e reclamantes.

É notório em África, como muitos criam movimentos expressivos de revolucionários que em nada abonam a sociedade, pois muitos nem sabem o objectivo de um movimento revolucionário. Acreditam que ser revolucionário é atentar contra as normas, criando convulsões sociais danificando os bens públicos, ofendendo entidades ou pessoas jurídicas e singulares nas diferentes redes sociais e acabam por cometer crime inocentemente.

A juventude deve evitar pertencer em grupos com objectivos inconfessos no sentido de evitar animosidade, estress e frustrações. A juventude é a força motora da sociedade pela qual recai a esperança nacional, suas acções devem estar pautadas na responsabilidade e ética social, independentemente do fenómeno.

Termino com a frase do grande filósofo grego Sócrates, que marcou a história quando trouxe o olhar do ser humano para si mesmo. Ele dizia: “Ao invés de se ocuparem em buscar a riqueza material, as pessoas deveriam viver mais concentradas no seu próprio desenvolvimento; quem quer mudar o mundo para melhor precisa primeiro mudar a si mesmo”.

*Socióloga, terapeuta familiar e docente universitária

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